segunda-feira, julho 17, 2006

bicicleta com rodinhas

ciclismo



Era um belo sábado ensolarado, céu de brigadeiro, mar calmo, enfim um dia perfeito! Acordei cedo, motivadíssima, para a pedalada que iniciaria em Copacabana e terminaria no Leblon, passando pelo Alto da Boa Vista, Barra e Recreio. Um total de 100km. Eu disse terminaria. Lembrem-se disso.

Saí da casa do meu pai em Copacabana de bicicleta. Encontrei meu amigo Osvaldo no Leblon. Ele tinha tudo preparado para o treino: isotônico, bomba de ar, chaves para todos os tipos de conserto etc.

Partimos animadíssmos para a Vista Chinesa. E toma de subir ladeira. As pessoas sempre exclamam: como deve ser linda a vista lá de cima! E eu só posso dizer: deve ser porque a força que a gente faz para subir, não deixa a gente olhar pros lados... Chegamos à Vista Chinesa, depois Mesa do Imperador, Estrada das Canoas. Ahhhh! Como é bom descer!!!

Mas, como tudo que é bom dura pouco, São Conrado acaba logo e temos que subir o Joá. O Tanaka nunca foi tão longe... Superamos mais essa! Chegamos à Barra! Agora é uma beleza: só reta! É hora de dar um gás na velocidade para chegar logo no Recreio e tomar uma água de coco bem gelada. Ai que delícia!

A água de coco está perfeita: gelada e doce. Mas uma surpresa estragou o momento: meu amigo vem e me diz:

- São 11:20. Tenho que estar em Ipanema às 12:00. (mui amigo!)

- Osvaldo, nós vamos voltar de táxi ou van?

- Como assim? De bike! A gente volta rapidinho.

- Osvaldo, talvez você não tenha notado, mas a gente veio de bike e levou 1h20. Como você pretende voltar em menos tempo? Eu não agüento, não, maluco! Você não acha que devia ter me avisado antes? Ou trata-se de um homicídio em 1o. grau?

Partimos. Não adiantava mais discutir. Quanto mais tempo a gente discutisse, mais força eu teria que fazer e nessa só eu me dava mal. Quando chegamos ao fim da Barra (ou início dependendo do ponto de vista, no meu caso era o fim pois já estávamos chegando ao viaduto do Joá), eu, já desesperada, digo:

- Osvaldo, eu não consigo subir essa serra (ah, porque nessa hora o Alto do Joá parecia a serra de Petrópolis) até a zona sul na velocidade que você quer. Tô velha, gorda e fraca. Nem tenta. Pára tudo e chama um táxi. Não quero mais brincar disso, não!

E não é que infeliz vem com a grande idéia:

- Vamos pelo túnel. Eu te protejo dos carros. Você vai na frente e eu vou mantendo os carros à distância.

Foi nessa hora que eu vi um sinal divino na entrada do viaduto:

sinal

Que eu, idiotamente, ignorei. Segui as instruções do cara. Afinal, ele estava me treinando e eu deveria confiar nele.

Detalhe: as luzes do túnel estavam apagadas. Na verdade, nessa hora, o túnel parecia aquele trem-fantasma do Tivoli, que eu levei uns três anos para ter coragem de entrar. Havia, porém, uma luz no fim do túnel que não era a solução dos meus problemas, pois isso significava que apenas a primeira parte do túnel havia passado. Quando surgiu a claridade, fui para o acostamento, que estava coberto de cascalho. Caí, derrapei, me ralei toda. Quando ia me levantar, vi minha perna toda rasgada. Que horror! Me acalmei quando me lembrei que não estava sozinha.

Mas seria por pouco tempo. Meu mui amigo, preocupado com seu horário, parou uma van no meio do viaduto, me colocou dentro, enfiou minha bicicleta no porta-malas e foi embora. Se alguém quiser um amigo assim, eu dou o telefone - não sou egoísta. Acho que o motorista viu meu desolamento pelo retrovisor. Puxou conversa. Consegui que ele me deixasse usar seu celular a cobrar (o meu estava com meu "amigo"). Ele me deixou na casa da minha avó, que até aquele momento achava que eu só estava meio ralada.

Depois do susto, minha super-avó (ela tinha 84 nessa época) pegou dinheiro e partimos para o hospital. Pegamos um táxi. o motorista, ao ver meu corte, expressou-se de maneira intensa:

- Caralho!

E minha avó prontamente respondeu:

- Jesus Cristo!

No sinal de trânsito, o motorista olhou pra trás e disse:

- Caralho!

E minha avó:

- Jesus cristo!

E assim fomos de Ipanema a Botafogo. Uma verdadeira batalha entre "Caralho" e "Jesus Cristo", onde ninguém ganhou e eu ainda tive que ensinar o caminho do hospital porque o maluco ficou tão nervoso, que teve amnésia. A coitada era eu e eu é quem não teve o direito de ser mulherzinha nessa hora. Os dois estavam pálidos, à beira de um desmaio. Vi a hora que eu ia acabar dirigindo o táxi para socorrer o motorista...

Chegamos ao hospital. Entro pulando num pé só, fantasiada de ciclista (a gente saía a caráter para os treinos), pingando sangue pelo caminho. Me puseram numa cadeira de rodas sob muitos protestos meus.

- Não sou fresca! Não preciso de cadeira de rodas! Dá pro motorista do táxi que está pior do que eu!

Fui para a emergência. Desabei. Não deixava o médico fazer nada sem ter que responder um extenso questionário. Eu queria que fosse que nem no "Plantão Médico" onde os médicos do seriado explicam tudo. O cara já queria me dar uma anestesia geral para ver se eu calava a boca. E a minha avó, coitada, sentada num banquinho assistindo essa cena.

Chegou a hora de dar os pontos. Ai, ai, ai. Anestesia local. Mas antes um calmante para eu deixar o cara me dar a anestesia. Ele me mostra a agulha. Socorro! Tenho horror a agulha! Tento negociar com o cara:

- Doutor, não tem uma bolinha mais forte? Essa analgésico não fez o menor efeito. Me apaga! Por favor!

Ele mudou de agulha para uma menor e foi aplicando de levinho em torno do corte. Antes d'ele me costurar, um último pedido:

- Doutor, testa para ver se toda a área está realmente anestesiada. Tem anestesia mais forte? O senhor não tem mesmo uma bolinha? Umazinha só! Eu não conto pra ninguém! Libera aí, vai!

Nada feito. Superamos os pontos sem maiores traumas para mim, porque o médico jurou que nunca mais queria ver a minha cara. Veio a hora de limpar os ralados. Novo detalhe: seu eu soubesse que limpar os ralados doía muuuuiiiito mais que tomar a anestesia, teria segurado a onde antes de acabar com a paciência do médico. Rezei, mordi uma toalha e mandei ver. E minha avó sentada no mesmo banquinho, assistindo essa cena, mas agora horrorizada.

Voltei para casa. Resolvi ir para casa do meu pai. Mais confortável: empregada, enfermagem particular... Encontrei Maria Antonia, minha irmã pequena e maravilhosa. Hoje ela tem seis anos, mas na época três. E começamos a seguinte conversa:

- Maria Paula, que dodói é esse?

- Caí de bicicleta.

- Eu nunca caí da minha bicicleta. Você tava na ciclovia?

- Não, Maria, eu não estava na ciclovia.

- Ah, Maria Paula, bicicleta não é pra andar na rua. É pra andar na ciclovia. Você tava muito rápido?

- Eu estava, Maria Antonia...

- Ih, Maria Paula, tá tudo errado. Eu não ando rápido. Só devargarzinho. Lá na ciclovia. A sua bicicleta tem rodinha?

- Não.

- Ah, Maria Paula. Então você precisa colocar!

Maria Antonia na Lagoa 2006

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